Um enfermo "curado" às quintas

Há algum tempo, a vida está às avessas. Trocando os pés pelas mãos, tropeço em nuvens enquanto fito um chão que pouco inspira. Adoeço de um olhar vazio, de tempo parco, de exaustão dos dias sem a poesia de poder escrever senão um pouco.

Mas quinta-feira chegou. E como amo as quintas. Nelas, as mazelas se amiúdam. Apequenam-se o suficiente para um mero escriba feito eu sentar-se à mesa vazia do café da manhã na tentativa de construir algum texto de farelos, que, no entanto, expresse majestosas farturas.

Saudoso eram aqueles meus dias boçais sepultados, época em que era fácil a vida de escritor descompromissado de onde germinaram o que já foi lido por quem se apetece com minhas anedotas. Hoje, em lirismo peco, porque as canções me escapam pelos ouvidos na medida que a moléstia se agrava. Dela sararei, por ora, somente às quintas.

Desconheço a denominação médica daquilo que contraí; por isso, tratei eu de nominá-lo aos meus conformes. Falência Mental. Se me permitem adiantar um pressuposto, não me chamem de louco. Entendam como preocupação, afinal ando vagaroso nos pensamentos, fenômeno um tanto extraordinário para mim. Sempre muito buliçoso,os estalos eram frequentes, as produções mais charmosas e minhas vontades satisfeitas.

Minha falência mental parece crônica. Crônica... Gosto do predicativo que tanto me faz lembrar de quando crônica eram os meus textos e minha criatividade. Até o dia que este meu querido termo estiver adjunto ao meu distúrbio fugaz – fazer o quê? – terei de me contentar com palavras vindas com tremendo esforço e com um arranjo que sempre não me agradará. Às quintas, travo combate com que ameaça a sanidade de meu antigo deleite que, por coincidência, chama-se crônica.

Proclamo este meu tempo crônico de falência mental.