Paletas

sábado, 28 de novembro de 2009

FÉRIAS DO PATRÃO

É bicho luxento o homem. As coisas precisam estar ao seu fácil alcance, as soluções devem vir quando estalados os dedos e os desejos (ah, os desejos…), se realizados, de preferência, após o toque de um botão, melhor. A artimanha de sistematizar tudo em chaves de “on/off” diz muito sobre o meu e o seu imediatismo, aquela necessidade de que tudo aconteça quando bem quisermos. A ânsia é tão grande que esse poder nos foi concedido inclusive para comandar recursos que, antes, pensávamos nós que só a Deus cabia a decisão.

Hoje, a luz e a água estão sob controle de botões e registros instalados em casa, cuja mera existência dá um pouco de sossego a Deus, alguém extremamente atarefado com orações e seus outros afazeres celestiais.

Nisto tudo fui colocar reparo esses dias. Já era noite e Deus quis desligar a chave geral de luz dos nossos cantos ocidentais. Quem quisesse iluminação, bastava levantar da poltrona e apertar o interruptor na parede. Na normalidade de nossa vida cheia de mordomias, a televisão estava ligada e pelo menos três cômodos com suas luminárias acesas.

Por força do hábito, o sofá recebia corpos fatigados que nele se estiravam enquanto manejavam a TV com uma mão e, com a outra, seguravam um copo de bebida – na maioria das vezes, aquela cervejinha trincando para desestressar. Até que, inusitadamente, só foi audível a bebida descer goelas abaixo. A TV piscou e morreu; a geladeira não dava um piu e o interruptor (este sim foi uma decepção) não atendia mais aos comandos. “Ai meu Deus, o que aconteceu?” – aí o apelo coube; quando o breu e a caluda reinaram juntas, sem que fosse possível o homem destroná-las com o seu poder equiparado aos míticos.

O dia se fez dia como de costume: o Sol se ergueu e mandou luz para todo mundo. E enquanto eu e mais um monte de gente procurávamos explicações pela perda de nossos controles na noite anterior, alguns se preocupavam com o sumiço do crucifixo numa das salas de Brasília. Para nós, espertalhões autônomos e todo-poderosos, estranhamento nem precisava existir e a ausência deveria ser compreensível. Tudo bem que pelas bandas da capital muitas coisas sumam sem explicação, mas desta vez ninguém ousou passar a mão em nada. Deus simplesmente está de férias e levou o filhão junto; porque, no fim das contas, o mundo está sob o meu e o seu comando, tudo resumido em simplórios botões de “on/off”.

E nem para termos lhes desejado um bom descanso...

3 comentários:

Juliana Bragança disse...

nossa! muito bom seu texto! ta de parabens!
bjos

Expressivas Impressões disse...

Gostoso de ler. Gostei muito desse texto.

FFF disse...

Tomara que as férias dele estejam acabando, pois, se com ele as coisas andam tenebrosas, imagine sem ele. Parabéns pelo blog.